domingo, 26 de abril de 2020

Estado de espírito: ?

Já se passaram quarenta e seis dias de quarentena. Sim, dei-me ao trabalho de os contar. 
Com eles aprendi muita coisa. Descobri-me. Tomei decisões. Renasci. E ainda não sei quantos mais dias se irão passar. 
Aprendi a viver confinada a determinadas coisas, a determinados sentimentos, e atenção que isto é muito vago, os sentimentos tanto podem ser positivos como negativos. Aprendi a suportar tantos estados de espírito juntos que nem eu própria sabia que existiam. Não sabia que podia acordar bem disposta e adormecer depois de ter tido um ou dois ataques de ansiedade. Não sabia que iria conseguir chorar até adormecer por não suportar ver o meu filho implorar por ver os avós... Não sabia que o medo que senti inicialmente iria dar lugar a uma super proteção mas também a uma consciência mais libertadora. 
Descobri que sou mais forte do que penso. Mas não mais do que aparento. Descobri que o meu ar de menina sorridente para a vida é capaz de chorar por simplesmente não poder entrar no carro e ir às compras com normalidade. Descobri que os meus interesses não são aquilo que penso, e que afinal gosto de coisas que não sabia. Descobri que o meu futuro é incerto e que quero continuar a arriscar até não conseguir mais. Descobri que por mais que eu erre quero voltar a tentar. Descobri-me por inteiro!
As decisões mais difíceis de tomar na vida são aquelas que não queremos tomar nunca. Quando temos demasiado tempo damo-nos ao trabalho e à disposição de pensar nelas e por fim, decidir. 
Renasci por me descobrir. 
Li em alguns posts do facebook desabafos das mães que estão em casa com os filhos e graças a Deus que não me sinto mais a pior mãe do mundo. Apesar do Salvador ter apenas três anos, a personalidade forte dele com a minha torna alguns dias uma total explosão de gritaria, birras e discussões. Porque não podemos dizer que estamos cansadas, fartas e exaustas sem alguém nos dizer que existem pessoas piores do que nós? Temos de agradecer como é óbvio de estarmos bem de saúde, no conforto das nossas casas. Mas então deixamos de ser pessoas normais por isso? A profissão de mãe deixou de ter valor? Ou não temos direito a ficar cansadas? Fartas? Pior, nem sequer temos direito a ter liberdade de expressão por nos queixarmos de um sentimento que inevitavelmente se apodera de nós... É triste que só possamos ver o lado das outras pessoas e não pensar um pouco em nós!
Também faço parte do leque de mães que com esta quarentena começou a fazer comida que nunca fez e a descobrir que até tinha jeito mais alguns pratos. Sou daquelas que fez um bolo por semana no primeiro mês e agora descobri que até gosto de passar trinta minutos do dia a pedalar na minha bicicleta que estava a ganhar pó na minha sala. Mas o pior disto tudo, é o meu medo do que esta quarentena está a fazer ao Salvador... O desinteresse pelas atividades propostas pela educadora, o choro e as birras quando lhe tento "ensinar" alguma coisa. O não perguntar porque não vai à escola, nem perguntar pelos amigos... Tenho medo de, certa forma, estar a errar em alguma coisa como mãe.
E não tenho problemas, nem sequer vergonha de admitir os meus erros e de tanto que fraquejei nestes dias como continuo a ceder em algumas coisas... Cedi ao pedido do meu filho ir ver os avós, e mesmo com restrições nós vamos. Se é um ato correto? Claro que não, tenho plena consciência. Sou fraca? Não! Sou humana, e não foi apenas um pedido que me fez ceder, mas sim o meu próprio estado de espírito e a minha forma de encarar estes dias que acreditem, não estão a ser nada fáceis.
Para terminar este meu desabafo, vou me direccionar às redes sociais, que na minha modéstia opinião tornou-se num poço de ódio e rancor uns com os outros em que os adultos decidiram despejar as frustrações desta quarentena uns nos outros. Por favor, não estou a generalizar, nem a apontar o dedo. Mas que ao menos este isolamento / quarentena / obrigação de, sirva para nos tornarmos pessoas melhores, que mais não seja pessoas que conseguem ler e continuar a subir os conteúdos. 
Ainda não sei quantos mais dias vou continuar por aqui...
Ainda não sei como será o futuro...
Nunca irá ser totalmente normal isso é uma facto!
Não sei se quero continuar como estava antes de tudo isto... 
Mas de uma coisa tenho a certeza, vou sair disto com uma perceção diferente de tanta coisa...

Fiquem bem... Dentro do possível...





















Beijinhos,
Carla Salgado

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