terça-feira, 16 de maio de 2023

Quando eu morrer...

 Quando eu morrer, quero se lembrem de mim. 

Sejam pelas coisas boas ou más, quero que se lembrem que existi. Que vivi, sorri muito, chorei, gritei, fiz asneiras, resolvi problemas, quero que se lembrem que fui sempre feliz, em todas as fases da minha vida, independentemente do que possa ter acontecido.

Quero ser lembrada pelas músicas que ouvi, que dei uma banda sonora a cada momento da minha vida. 

Quero ser lembrada pela pessoa que eu fui. Para alguns boa pessoa, para outros má, mas mesmo não agradando a toda a gente, no meu coração, ficará marcado as boas ações que se sobrepõe a qualquer má atitude.

O que é uma má atitude numa magnitude de partilha e amor que consegui transportar para o outro?

Quero ser lembrada pela amiga que fui. Nada perfeita, nada fácil, mas presente, para quem mereceu a minha presença, calorosa e sorridente. O abraço, a palavra, esteve sempre lá. Nem sempre a agir da melhor forma, mas perfeição é algo que nunca consegui transpor.

Quero ser lembrada pela filha que fui, que apesar de tempestades e furacões, amei muito e tornei-me numa mulher forte graças aos meus pais. Porque não ganhamos força nas coisas boas, muito menos nos bons momentos. Ganhamos força na adversidade. E eu cresci na adversidade. Sou forte, e nunca ninguém me vai fazer acreditar no contrário, porque os meus pais, com os seus defeitos, também com as suas qualidades, mostraram-me que eu era capaz.

Quero ser lembrada pela irmã que fui, que mesmo ter aterrorizado tudo e todos não sabia viver sem o mimo e o apoio. Que o amor de irmãos é possuído pelo sentimento agridoce do amor e do ódio, crescemos a querer estrangulá-los e vivemos com saudade disso.

Quero ser lembrada da mulher, namorada e amante que fui. Nada fácil. Um caminho difícil que foi trilhado durante muitos anos. Mas se há elogio que recebo muitas vezes, é que sou a melhor esposa e mãe do mundo, e isso ninguém me tira. Quero ser lembrada que amei muito do meu jeito, que vivi intensamente cada momento. Que chorei, chorei muito, por medo de perder. Há amores que não se perdem, e eu vivi para experenciar isso.

Quero ser lembrada da mãe que fui... O melhor papel da minha vida. Quero que o meu filho se lembre de mim com sorrisos, como eu lhe ensino todos os dias, a sorrir, para tudo. Nas quedas, nos medos, tudo. Sorrir é a arma da nossa fortaleza. Quero ser lembrada pela esperança, pela força, pelo amor, o amor que transbordou todos os dias desde que fui mãe pela primeira vez. O amor que move mundos, montanhas, que derruba tempestades e furacões. O amor é a base de tudo. E todos os amo-te que eu não disse aos meus pais, ensinei o meu filho a dizer, normalizado. 

Quero ser lembrada pelo corpo às balas que viveu sempre, freneticamente, intensamente, descontroladamente.

Quero ser lembrada da criança mimada, a adolescente insegura, e a adulta madura que fui. 

Quem melhor do que eu para elogiar a pessoa que fui?

Quero ser lembrada, apenas.

Quando eu morrer...

quarta-feira, 3 de maio de 2023

Filhos de pais separados - Parte II

 (...)

Quando encontramos aquela que é a pessoa com quem queremos passar o resto da nossa vida, vem também uma bagagem recheada. Os pais, os irmãos, todos aqueles que têm ligações emocionais. Muitas vezes ouvimos "casaste com o teu marido, não com a família dele". Será bem assim? Quantas, quantas pessoas não passam uma vida inteira com problemas com o cônjuge por conta dos familiares? Quantas não são as famílias destruídas por ouvir opiniões alheias?

Não sei vocês, mas eu procuro várias vezes a minha mãe para desabafar, talvez para encontrar respostas que não encontro. E quantas vezes isso não poderá prejudicar um casal?

Quando há o término de uma relação, os nossos pais tendem a tomar partidos, principalmente pelo lado dos filhos. Olham para o outro lado do casal com rispidez, com desagrado. E a pessoa certa são sempre os nossos filhos.

E assim começa o pesadelo da Beatriz.

Entre fins de semana e guarda partilhada do pequeno Mateus, a relação da Beatriz e do Miguel era cordial. Os pais do Miguel não aceitaram bem o fim da relação de ambos. A aversão que ganharam da nora foi tanta que acharam que o melhor caminho seria fazer com que o Miguel nutrisse o mesmo sentimento.

O pai do Miguel, o Joaquim era alcoólico, a forma como tinha de se abstrair dos problemas que a vida lhe impunha, e como se não bastasse, quando a raiva se juntava à vontade de beber, as agressões tornavam-se num escape.

O medo da Beatriz, para além de que o filho pudesse, de certa forma, sofrer deste tipo de agressões por parte do avô, eram as conversas que tinham perto da criança. Coisas que pudessem dizer ou fazer sobre a mãe que se pudesse refletir mais tarde em alguma represália.

Quando Beatriz percebeu que as coisas não corriam bem em casa dos pais do Miguel, teve de se impor, e assim, a relação cordial que tanto preservaram em manter chegou ao fim. Começaram-se a denotar comportamentos diferentes no Mateus, assim como a forma como ele tratava a mãe. Miguel não queria assim tanto saber do filho como queria transparecer nas redes sociais, o lugar onde tudo é cor-de-rosa.

Tudo começou a ser diferente.

Mateus tinha apenas três anos quando viu os seus pais a separarem-se. Uma criança indefesa, que pouco ou nada conseguia perceber daquele assunto, senão apenas de que, já não iriam viver os três juntos na mesma casa.

 


continua (...)